*Resenha* Menino de Ouro
Dizer que esse livro me deixou impactada é pouco. Estava na minha lista há mais de um ano e traz protagonismo intersex, que ainda não tem muita representatividade na mídia. É uma narrativa muito intensa, com vários pontos de vista que mostram como os personagens lidam com situações envolvendo família, escola, amizades e relacionamentos amorosos.
Max sempre se identificou como menino. Ele é perfeito, como filho, irmão, aluno e atleta, é popular, bonito e é o pegador da escola, todas as meninas estão sempre correndo atrás. Mas Max nunca foi além do beijo, pois seu maior segredo é ser intersex, algo que ele nem entendo muito bem, pois sua família não fala muito sobre o assunto. Então acontece uma situação extrema que faz com que Max repense sua sexualidade e sua identidade, e de repente sua família e vida perfeitas começam a desmoronar, deixando claros conflitos não resolvidos e feridas que nunca sararam.
Além do ponto de vista de Max, também somos apresentados às visões de sua mãe Karen, seu irmão mais novo Daniel, a médica Archie, a menina solitária Sylvie e o pai de Max, Steve. Por meio dessas vozes, vemos a família aparentemente perfeita que é um tanto disfuncional e um pouco da história médica sobre pessoas intersex. Os capítulos de Archie são muito interessantes pois ela é uma clínica geral e que passa a buscar o máximo de conhecimento possível sobre o assunto após atender Max, e percebe que nenhum de seus contatos tem muita informação, já que muitas vezes cirurgias são feitas para definir o gênero assim que o bebê nasce, e a pessoa nem sabe que é intersex conforme cresce.
Por meio dos capítulos de Karen e Steve vamos descobrindo quais decisões foram tomadas sobre Max e o motivo de cada uma, como possíveis cirurgias e tratamentos hormonais.
A Karen foi a personagem mais irritante. Ela está sempre comparando os dois filhos, falando como Max é perfeito e gentil e atencioso enquanto Daniel é difícil e brigão – e o pobre Daniel percebe a preferência clara da mãe. Ela toma atitudes que diz ser para o bem do filho mais velho, mas são na verdade um tanto egoístas – que raiva que me deu dessa mulher -, pois ela só quer que “as coisas voltem ao normal” e que tudo seja perfeito, sem perceber que nada nunca mais será igual para Max. Ela também não percebe os sinais da depressão de Max – o que de fato não é uma coisa fácil de perceber, mas ela simplesmente ignora qualquer possível problema, pois confia que Max irá resolver.
Isso coloca muita pressão em Max, que sente que tem que lidar com tudo sozinho e não quer causar nenhum incômodo aos pais, Ele é a pessoa mais fofa do universo, eu tinha vontade de enrolar plástico bolha em volta dele e protegê-lo. E a jornada dele é muito intensa e pesada, não apenas em relação à sua sexualidade e identidade, mas envolvendo consequências de um ato terrível que acontece logo no início do livro.
Não tenho como falar sobre todos os personagens, pois é uma história intrínseca em que as ações e reações revelam os pensamentos e até mesmo o caráter de cada um.
O livro é cheio de reviravoltas e revelações chocantes, cenas intensas e cenas doces, e traz muito informação sobre intersexualidade e sobre o que significa ser intersex.
Representatividade como essa é muito importante para quebrar tabus e acabar com ideias erradas, com preconceito infundado, além de ser um apelo por tratamentos médicos mais humanos e mais empatia da comunidade médica.
Foi uma leitura que eu gostei muito, mas acho importante informar que há uma cena explicita de estupro contada em primeira pessoa logo no começo do livro. É uma cena realmente difícil de ler, mas entendi a razão para ter sido incluída pela autora Abigail Tarttelin – o impacto emocional da situação e dos envolvidos, e todas as consequências que isso trará. Dá para pular a parte em que isso acontece e seguir com o livro sem perda de informações importantes.
No Brasil, o livro foi publicado pela Globo Livros.
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