*Resenha* Cartas para Martin
Este é o tipo de livro que todos deveriam ler. É uma história tão importante e real, chocante em como ela reflete a realidade. É a mesma coisa que ouvimos todos os dias nas notícias.
Enquanto ajudava sua ex-namorada bêbada a chegar em casa em
segurança, Justyce se vê na mira de uma arma. Um policial branco o mantém
algemado por horas, e toda a experiência faz Justyce repensar seu mundo
inteiro. Sendo um garoto preto em uma escola majoritariamente branca e rica,
Justyce está acostumado a micro agressões e racismo velado, mas depois daquela
noite, ele não sabe mais como ignorar isso. Ele então decide tentar viver de
acordo com os ensinamentos do Dr. Martin Luther King Jr, e começa a escrever
cartas para Martin, como um diário. Isso fica ainda mais difícil depois que ele
e seu melhor amigo são baleados por um policial fora de serviço, e Justyce é
lançado em um circo selvagem da mídia e da opinião pública, tudo isso enquanto
tenta lidar com a morte seu melhor amigo. Ele luta com seus sentimentos, tenta
lidar com um sistema fraudado contra ele, no qual ele sempre será visto como um
cara mau, simplesmente por ser preto e pobre.
Soa familiar? Não vimos essa história repetidamente no
noticiário? Não protestamos e lutamos contra a injustiça e a impunidade? E, no
entanto, continua acontecendo, pessoas pretas continuam sendo assassinadas e os
policiais brancos continuam se safando com uma bronca.
Este livro é extremamente sensível e brutalmente real.
Justyce é um personagem principal incrível, todas as suas dúvidas e medos são
válidos e sua raiva justificada, e ele ainda consegue manter sua doce
personalidade e suas crenças.
O melhor amigo de Jystice, Manny, tem dinheiro e por isso é
amigo de um grupo de garotos da escola que são o tipo de pessoa que acredita
que não existe mais racismo e que todos somos iguais perante as leis, e que ignora
as injustiças que acontecem fora do seu campo de visão. O próprio Manny, pela
condição financeira da sua família, não sente na pele até que Justyce aponte
para ele, depois de anos de frases racistas em tom de piada, estereótipos nocivos,
comentários preconceituosos vindo de alguém que diz “eu não sou preconceituoso,
mas...”, “eu não sou racista, mas...” – um dos amigos usa uma “fantasia” de
membro da Klu Klux Kan para uma festa de Halloween.
Mas no fim do dia, Manny é mais um garoto negro, e isso é
tudo que importa para o policial negro que o mata a tiros. Isso é tudo o que
basta para que ele seja pintado como traficante de drogas, gangster, com
certeza estava metido em coisa errada; não importa que ele fosse um estudante
dedicado que estava a caminho de uma universidade de elite, assim como Justyce.
Não importa que eles só estivessem ouvindo música alta enquanto dirigiam pela
cidade. O policial – que estava fora de serviço – se sentiu ameaçado, e por
isso suas ações são justificadas.
A forma como a autora Nic Stone usa a opinião pública e a mídia
é muito efetiva, afinal, é exatamente assim que acontece na vida real. Nós só
vemos o que os jornais, as redes sociais nos mostram, não sabemos o que se passa
na cabeça de uma vítima de brutalidade policial, mas sabemos que vai ter um
monte de gente pronta para dizer como o policial estava só fazendo seu trabalho.
A história também mostra que é possível aprender com os erros,
crescer e se desculpar. Por isso precisamos cada vez mais de narrativas que nos
ensinem a lutar, que apontem o que há de errado na sociedade para que cada vez
mais pessoas lutem contra injustiça e a favor de um mundo mais justo e melhor
para todxs.
O livro foi recentemente publicado no Brasil pela editora Intrínseca, e o segundo volume, Dear Justyce, será lançado nos EUA ainda esse ano.
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